Um dos favoritos para vencer a Copa do Qatar, no caso, a Espanha, enfrentou uma equipe que tinha como maior objetivo apenas passar de fase, no caso, o Marrocos. Quase todos que acompanham o futebol esperava uma vitória espanhola. Só que não aconteceu. O jogo acabou 0 a 0 e nos pênaltis Marrocos venceu por 3 a 0. Inicialmente, vamos analisar alguns números do jogo (FIFA):
No entanto, esse zelo pela posse de bola muitas vezes inibe as tentativas de ataque espanhol. Entre arriscar um chute de longa distância ou um cruzamento, que possuem baixos índices de conversão em gol, os espanhóis preferem ficar com a posse e tentarem criar melhores oportunidades de gols, por meio de passes curtos e movimentações dos atletas. Então, se olharmos para os chutes a gol, durante 120 minutos (incluindo a prorrogação), vemos apenas 13 chutes no total da Espanha. Para quem dominou tanto a posse de bola, é um número muito baixo de tentativas, equivalente a 1,08 tentativas a cada 10 minutos de jogo. Só como parâmetro, imagina jogar durante 30 minutos de prorrogação e chutar apenas 3 vezes no gol adversário? É muito pouco para quem quer ganhar um jogo tão importante. Ao aprofundar ainda mais no número de chutes a gol, vemos que apenas um chute foi no gol, os demais, ou foram para fora (6), ou tiveram algum tipo de bloqueio antes de chegarem no goleiro. Isto é, em 120 minutos, o goleiro marroquino foi realmente exigido uma vez. Só uma. Ao analisarmos os cruzamentos, os espanhóis fizeram 27, no entanto, apenas 4 tiveram algum tipo de conclusão (cabeceio ou chute). Os marroquinos cruzaram apenas 10 vezes e também conseguiram as mesmas 4 conclusões. Isto nos mostra que a Espanha não baseia seu jogo nos cruzamentos. Os atacantes não entram na área esperando esse tipo de jogada e quando a bola vem de um cruzamento, há pouco empenho em concluir a jogada. Sabemos que os jogadores espanhóis são muito qualificados e habilidosos. No entanto, o modelo de jogo que a Espanha faz, é exatamente para a forma como os marroquinos estavam preparados para defender: equipe compacta na defesa, com muita pressão no adversário com posse de bola, sem oferecer tempo para pensar e espaço para jogar. Além disso, diversas coberturas fechando linhas de passes e possibilidades de dribles. Isto é, soluções práticas para dribles e passes curtos. A receita ideal para anular o ataque espanhol.
O que realmente incomoda as equipes que jogam recuadas, sem posse de bola, como os marroquinos, são as jogadas incisivas que chegam na área o tempo todo, como:
Isto é, um “pacote de soluções ofensivas” que fazem a bola chegar na área marroquina o tempo todo, fazendo a vida do goleiro parecer um “inferno”, com o perigo rondando o tempo todo o gol dele. Desse “pacote”, os espanhóis usaram apenas metade das soluções (somente as duas primeiras). Estas mesmas instruções estão no meu livro Futebol: as táticas aplicadas aos treinamentos e jogos, num capítulo específico sobre como atacar cada tipo de defesa (trecho e imagem a seguir):
O treinador espanhol Luis Henrique deu entrevistas dizendo que a equipe dele era a que tinha o futebol mais bonito da Copa do Qatar. Podemos concordar ou não, mas um fator essencial para se tornar campeão é a eficácia do seu jogo. A beleza do jogo deve ser traduzida em gols e vitórias. Podemos ter um time de malabaristas com a bola, que terão aplausos constantes do público, mas se o adversário fizer jogadas mais simples e conseguir mais gols que nós, a copa acaba, como acabou para os espanhóis. No vídeo a seguir tem os melhores momentos do jogo em que é possível perceber pouco incômodo para o goleiro marroquino, inclusive que o Marrocos teve praticamente as mesmas chances de marcar gols como a Espanha teve, mas com muito menos posse de bola.
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Copa do mundo: quando a tática supera a técnica. Análise de Argentina 1 x 2 Arábia Saudita7/12/2022 Nos esportes em geral, é relativamente fácil prever quando uma equipe irá vencer a outra, levando em consideração a qualidade técnica de cada elenco. No basquete e no vôlei, por exemplo, são necessários muitos pontos até definir o vencedor do jogo. Assim, diminui a chance de uma “zebra” acontecer. Já no futebol, apenas um gol pode dar a vitória para um dos lados, mesmo que este lado tenha atuado num nível abaixo durante o jogo todo. Por exemplo, uma equipe chutou a gol umas 20 vezes enquanto o adversário chutou apenas uma vez. A probabilidade é que vençam os que tiveram mais oportunidades de fazer gol, no entanto, aqueles que chutaram apenas uma vez fizeram o gol. Há quem diga que essa é a beleza do futebol, a imprevisibilidade dos resultados. Diante dessa descrição, vamos analisar um dos resultados mais surpreendentes da Copa do Mundo do Qatar, em 2022. Argentina 1 x 2 Arábia Saudita Inicialmente vamos analisar alguns números do jogo (FIFA):
Imagine que você é o treinador de uma equipe que é nitidamente inferior ao seu adversário. Ainda, acrescente nessa equação que no ataque adversário joga Lionel Messi, um dos maiores jogadores da história do futebol. Problema posto, qual seria a forma lógica e correta de você montar sua equipe? Bem fechado na defesa e explorando os raros contra-ataques que poderão surgir. Assim, os números do jogo apresentados fazem sentido, é o que realmente aconteceu. Eis a grande questão, como os sauditas complicaram o jogo dos argentinos? Jogar com a defesa compacta não é nenhum grande segredo, pois toda equipe que defende bem faz isto. O diferencial saudita foi atuar com a defesa em linha, provocando vários impedimentos (10) dos argentinos, que tiveram dificuldade em aprofundar o jogo e em movimentar num espaço reduzido. Só que não foi simplesmente uma defesa em linha básica, foi uma linha avançada (próxima do meio-campo), que conseguiu pressionar os meio-campistas argentinos, dificultando muito para os armadores criarem os melhores passes. Isto é, não deram tempo e espaço para os criadores do time fazerem as melhores jogadas.
No entanto, os sauditas assumiram um risco grande ao fazerem a linha tão avançada, próxima do meio-campo, oferecendo muitos espaços para lançamentos dos atacantes velozes argentinos. Aqui aconteceu a ousadia saudita com uma boa dose de sorte: 3 gols argentinos foram anulados por impedimento. E não foram impedimentos claros, em que o atacante fica muito adiantado, foram aqueles lances em que se a bola tivesse saído milésimos de segundo antes, os lances teriam sido validados. Na imagem a seguir, o primeiro gol anulado de Messi, por impedimento, com a defesa saudita em linha muito avançada, próxima do meio-campo. Na imagem a seguir, o segundo gol anulado de Lautaro Martinez (no meio da defesa saudita, inclinado à frente), por impedimento, com a defesa em linha numa região adequada, mas com o goleiro distante (cobertura ineficaz). Na imagem a seguir, o terceiro gol anulado de Lautaro Martinez, por impedimento, com a defesa “toda quebrada”, sem pressão no armador, num lance de sorte da defesa saudita. No vídeo abaixo é possível ver os melhores lances do jogo, incluindo os gols anulados: Outra curiosidade desse jogo foi o discurso do treinador Hervé Renard no intervalo, que ficou famoso, após a vitória improvável:
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